sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Troca de óleo a cada 12 mil km?

Respondendo aos leitores Bruno Vieira e Narcio Baldi (ao final):

Disse o Bruno:

"Eu pretendo comprar uma NC700x, tenho lido muitos posts seus inclusive sobre o óleo honda e vejo que procede muito, essa moto é arrefecida a líquido e tem o giro baixo, mas a troca de óleo são 12 #@~$%& MIL KM, e você fala muito sobre motos de baixa cilindrada, queria saber sua opinião a respeito desta..."

Caramba, 12 #@~$%& MIL KM?

E eu pensava que já tinha visto de tudo em todos esses anos nessa indústria vital...

O motor das NC 700 é derivado do motor do carro honda Fit; na verdade, é metade do motor do Fit para mover uma moto, veículo bem mais leve, e também não é uma moto para altas velocidades.

A NC 700 é uma moto que cairia muito bem para meu perfil de viajante ocasional; gosto da ideia da baixa rotação e pouca vibração (=conforto) em velocidade de cruzeiro, junto com a economia e suposta facilidade de manutenção de um motor de base automotiva.

Fonte: http://motorcycle.honda.ca — Cotação do dólar canadense em 29/08/2014 igual a 2,065 reais por CAD.

O dia em que ela for vendida no Brasil pelo equivalente a R$14.556,18 mais impostos canadenses de 7%, eu compro uma.

Como na moto o motor não fará tanta força quanto no carro, eles aumentaram a tolerância para o intervalo de troca do óleo para 12 mil km (o Fit pede troca de 10 mil em 10 mil km).

Mas... não se pode transpor os parâmetros dos motores projetados para uso no Japão, terra fria, e feitos para usar gasolina japonesa (gasolina de verdade) sem fazer a tropicalização do projeto. Esse é o erro (erro?) que toda a indústria vem cometendo na última década, um possível motivo é explicado lá embaixo.

Os motores automotivos estão penando com isso.

O seguinte comentário publicado por Marcos nas perguntas do Yahoo em 2011 sintetiza (sem trocadilho) muito bem o problema dos óleos sintéticos:

Amigo, todos estão certos na teoria, mas na prática é outra história. Comprei um Palio Zero KM e no seu manual a troca deveria ser feita com 15 mil km. 


Pois bem, com 7 mil km o filtro antichama entupiu e a compressão jogou o óleo todo para fora do motor pela vareta de nível, que desapareceu.

Se você trabalha todo dia com o carro e roda mais de 15 mil km em menos de um ano, pode trocar a cada 10 mil km; senão, trocar a cada 5 mil km ou a cada 12 meses independente da quilometragem rodada. 

Tive várias Mareas 2.0 e enquanto segui o manual só levei prejuízo. Troquei o sintético por semissintético e as trocas de 20 mil km do manual para 5 mil km e nunca mais tive problemas. 

Esse óleo tem a tendência de virar uma borra e entupir as galerias de lubrificação. Pesquise na net os pepinos do motor 1.0 16V da VW em função dos lubrificantes.

Marcos - Yahoo - Troca de óleo sintético a cada qts km? 
https://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20111129094707AAZb6Ae

Pois bem, fui pesquisar (na verdade, eu já conhecia o problema, só fui obter dados comprováveis):
Imagem: Montagem sobre pesquisa google sobre revista quatro rodas oleo motor vw

E tive a sorte de encontrar na padoca o ex-proprietário de um vw Gol geração 5 modelo 2012 com motor 1.0, comprado zero km.

Logo aos 1000 km ele descobriu que o motor ficou barulhento porque tinha ficado sem óleo, nível abaixo do mínimo da vareta, o lubrificante tinha ido embora através dos anéis dos pistões.

Sabe lá o que é abrir um motor para reparo aos 1000 km? Pois é.

Disseram que foi erro de montagem, as aberturas dos anéis estariam alinhadas, permitindo o óleo passar mais facilmente. Conversa.

490 reais na troca do óleo sintético e sempre inspecionando e completando o nível. Aos 11 mil km o problema aconteceu de novo, e aí ele não quis mais saber do carro.

Esse problema aconteceu às toneladas, foi até assunto de denúncias e reportagens da Quatro Rodas.


Denúncia: http://quatrorodas.abril.com.br/autoservico/autodefesa/motor-barulho-508778.shtml

Solução apontada pela vw:
http://quatrorodas.abril.com.br/autoservico/autodefesa/deslizes-gol-517846.shtml

No final, a vw disse que o problema era a gasolina e o óleo do motor, e "sem culpar os clientes", mas culpando, afirmou que cometiam desatenção quanto a um item que é vital:

1) O excesso de álcool da nossa gasolina (que é uma w3*&@, estou fazendo uma postagem sobre isso) teria atacado e degradado o óleo do primeiro enchimento — hahaha, até parece que o problema ocorre apenas no primeiro enchimento... 

2) "O manual do proprietário da volkswagen classifica a repetição de trajetos curtos como “uso severo” e diz que, nesse caso, as trocas de óleo devem ocorrer na metade do prazo."

Veja que isso foi denunciado em outubro de 2009 e supostamente resolvido em dezembro do mesmo ano; no entanto, esse meu conhecido teve problemas com um modelo 2012 — o que prova que não é só o primeiro enchimento, não é só diminuir o intervalo de troca como dito nas reportagens da Quatro Rodas.

A viscosidade inadequada do óleo é parte importante do problema — os carros novos fumando e batendo o motor que você vê por aí todo dia o comprovam.

Lendo a declaração da vw sobre o manual do proprietário, você sacou o detalhezinho?

Gente, não é só o manual da vw, todos os fabricantes de autos e motos classificam trajetos curtos frequentes como uso severo

Percebeu a nhanha?

Quem de nós, proprietários, faz trajetos longos? Quem de nós faz uso que não seja classificado como severo?

Os motoboys? 

Não, a condição deles é de uso severo, são trajetos curtos e em alta velocidade.

Os viajantes? 

Quem de nós viaja o tempo todo? Que eu saiba, viajantes de longo percurso são só os caminhoneiros e motoristas de ônibus rodoviários.

Na prática, todo mundo faz pequenos percursos, e muitas vezes com trânsito bastante congestionado — a verdade é que todo mundo, queira ou não, faz o que eles chamam de uso severo de carros e motos — e portanto sempre deveria reduzir os intervalos de troca recomendados indicados nos manuais de proprietário à metade, isso é que é. 

Só que a responsabilidade por essa decisão é jogada toda para o consumidor, que não lê o manual. Coca-cola é isso aí.

Não seria mais lógico e racional determinar o intervalo de troca com base na quilometragem mínima, tipo 5 mil km para óleo sintético, sendo que essa quilometragem poderia ser prolongada em caso de uso leve (não severo)? 

Ah, mas aí ninguém teria problema de motor; e se os motores não pifam, como ficam as vendas de peças e motos e carros novos? 

Somente quando a coisa fica muito feia para o fabricante, a ponto de precisar trocar motores em garantia durante as revisões, e aparece uma denúncia publicada na Quatro Rodas e surge uma decisão judicial ordenando o recall é que eles tomam uma atitude, como fez a vw. Apenas o suficiente para sair dos holofotes.

youtube: Gol g5, porque seu motor estourou, explica VW!!

Cem carros, e eu tive a sorte de encontrar um. Então tá.

A imensa maioria de donos de vw, fiat, ford, gm, renault, peugeot, honda, etc. continuam rodando por aí com seus motores fumando e fazendo braac-clac-clac-clac a cada arrancada, e na hora de retificar seus motores vão achar que tiveram azar.

E nem vão poder reclamar, porque não leram o manual, a culpa foi deles, dirá o fabricante.

Não caia nessa de trocar o óleo da moto aos 12 mil km. Reduzindo à metade, isso dá 6 mil km para o pouco confiável óleo sintético de baixa viscosidade — óleo sintético de viscosidade correta para a temperatura do Brasil (20W-50) não deveria causar problemas, descontando o alto custo. 

Você arriscaria usar o sintético 10W-30 por mais de 5 mil km depois de saber o que aconteceu com os fiat Palio, Marea e os vw Gol acima? Fora os outros (é só pesquisar, ninguém escapa).

E olha que eles usam óleo 5W-40, que já é mais viscoso em temperatura normal do que o famigerado 10W-30... se ele não aguentou o tranco em motores arrefecidos a líquido, imagina um óleo ainda mais fino em motores arrefecidos a ar, como são as CG 125/150 e as CB 300 e XRE 300...

Para óleo mineral 20W-50, em motos arrefecidas a líquido, 3 mil km está de bom tamanho, se é que aguentará tudo isso. Por que motos têm motor de alta compressão e alta rotação.

Quando eu era um filhote nos anos 60 do século passado, começou a história de que os "novos" óleos minerais de então prometiam rodar 5 mil km sem troca. 

Os motores daquela época eram verdadeiramente de baixa compressão e rotação (taxa de compressão na casa dos 7:1, no Fit é 10,4:1), marcha lenta na casa das 450 rpm e máxima perto das 2500 rpm (no Fit é perto das 6 mil rpm) — e mesmo assim se sentia a diferença no rendimento do motor quando o óleo passava dos 3 mil km.

Essa aceitação de parâmetros irreais é coisa da nova geração de engenheiros que não tem vivência prática das condições reais brasileiras — teoria que eu já defendia e que foi confirmada na reportagem da Quatro Rodas: 

"Há quem fale no efeito das ondas migratórias que ganharam força na Volkswagen brasileira no início da década. A matriz buscou alinhar nossos produtos ao padrão mundial (sobretudo depois de a Fiat assumir a liderança de vendas) e trouxe alemães até para cargos intermediários. 

Planos de demissão voluntária incentivaram a saída de funcionários experientes, rumo a montadoras recém-chegadas. Na visita à fábrica da Anchieta, não foi difícil topar com jovens de jaleco impecável e sotaque carregado, que falam entre si em inglês ou alemão. 
(...) 
Até que ponto a presença estrangeira é parte dos pequenos problemas e até que ponto é parte das grandes soluções, é difícil dizer."

Aproveitando para responder ao leitor Narcio Baldi:

"Tenho uma intruder 800, o manual recomenda SAE API SE ou SF, 10w40 que deve ser semissintético. Se eu migrar pro 20W-50 mineral, pode afetar a bomba de óleo?"

O problema não ocorre na bomba de óleo, ocorre nas galerias que podem ficar entupidas com borra se você misturar óleo sintético com mineral. 

Caso você opte por abandonar o óleo sintético / semissintético e passar a usar óleo mineral de viscosidade adequada ao clima brasileiro (20W-50), lave o cárter com o novo óleo mineral, eliminando completamente os restos do óleo velho a fim de evitar a formação de borra por incompatibilidade química.

Um abraço,

Jeff

4 comentários:

  1. Obrigado pela resposta Jeff, acho que vou sim reduzir as trocas pela metade e sempre verificar o nível do óleo ( e seu estado), depois das duas revisões gratuitas ( der olho neles óbvio) mudo de oleo e parto pra uma mecânica de confiança. Um abraço

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    1. É só fazer exatamente o que o manual manda, Bruno. Nem mais, nem menos. E se precaver contra o que não está dando certo.
      Um abraço!

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  2. Jeff, fiquei com uma dúvida a respeito do óleo sintético e semissintético. Se o dono do marea tivesse mantido o sintético e apenas reduzido a troca a cada 5 mil km as borras teriam se criado da mesma forma? Acredito que não, mas como ele reduziu bastante o período de troca, optou pelo uso de semissintético pra reduzir um pouco os custos de manutenção.
    E até onde eu pesquisei a relação é sintético >> semissintético >>>> mineral (para a mesma viscosidade).

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    1. Olá, Daniel!
      As moléculas de óleo sintético são 100% sintetizadas a partir de gás natural, afirmam os fabricantes, e por isso seu tamanho é constante. Já o óleo mineral possui grande variação do tamanho das moléculas, daí sua menor resistência física. E o óleo semissintético é uma mistura dos dois tipos.
      O esforço mecânico aplicado sobre as moléculas homogêneas do óleo sintético se distribui por igual, enquanto nos óleos minerais as moléculas maiores são sobrecarregadas e se rompem, fazendo o óleo perder as boas características mais rapidamente.
      Óleo sintético resiste melhor a altas temperaturas e a borra aparece pela deterioração do óleo. Borra é sinal claro que o motor trabalhou com óleo deteriorado por excesso de tempo de trabalho e também pela exposição a temperaturas acima das esperadas para seu trabalho.
      Prazo excessivamente longo de troca somado à falta de reposição do óleo consumido são a receita para o motor se entupir de borra.
      Adequar o prazo de troca em função do regime de trabalho do motor conforme especifica o manual do Marea é fundamental em todos os motores. Esse prazo irá variar em função da resistência física do óleo, maior para o sintético, menor para o mineral e intermediário para o semissintético.
      Cada um deles irá exigir reposição mais frequente ou menos frequente. Balancear tudo isso é a chave para a longa vida útil do motor sem formação de borras nem desgaste acima do normal.
      Um abraço,
      Jeff

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