terça-feira, 30 de junho de 2015

Falando sobre rodas, pneus e banda de rodagem

Vou aproveitar para responder duas perguntas sobre pneus com uma única postagem.

Primeiro, o comentário do leitor Darci Neto na postagem Motocicleta não é brinquedo não, moçada:


Hoje notei uma coisa esquisita nos pneus da minha moto, que o traseiro tem os sulcos em um sentido e o dianteiro em outro, e de fábrica (Se olhar de frente a moto, o pneu dianteiro o sulco é "^" e o traseiro é "v"). 

Imagem: http://bestcars.uol.com.br/bc/informe-se/noticias/motos-honda-lanca-nxr-160-bros-que-comeca-em-r-93-mil/

Olá, Darci, obrigado por acompanhar o blog!

Também fiquei curioso com isso, vi as fotos na internet, todas as Bros que vi realmente são assim, dá a impressão de que um pneu gira ao contrário do outro, o que à primeira vista parece estranho.

Por razões construtivas, a carcaça do pneu possui um sentido de giro apropriado indicado por uma seta gravada na lateral da carcaça, e geralmente esse sentido está associado ao desenho da banda de rodagem. 

A seta tem de apontar para a direção de giro normal do pneu. Se a seta apontar para os dois lados, indica que o pneu não tem uma direção de instalação preferencial — mas depois de instalado, a direção escolhida não deverá ser invertida.


Se o pneu for instalado invertido, a carcaça será danificada e acabará se desintegrando e explodindo, uma situação que Deus nos livre, é potencialmente mortal.

Foi o que quase aconteceu com o pneu dianteiro da Kansas do Vinícius que no meio do caminho para Trindade o nosso colega e leitor do blog Mãozinha percebeu que estava montado invertido e que, por ter rodado muitos quilômetros nessa condição, estava a ponto de falhar catastroficamente:


Imagem: http://leaoesuamoto.blogspot.com.br/2011/11/pneu-montado-errado-risco-de-acidentes.html

Um erro de montagem como esse poderia ter acabado em mais um daqueles casos "motociclista perde controle", isola.

A história completa você lê na postagem do blog Leão e Sua Moto do amigo Vinícius: Pneu Montado Errado = Risco de Acidentes. 


http://leaoesuamoto.blogspot.com.br/2011_11_01_archive.html 
Então, sabendo que erros de montagem podem acontecer até mesmo em motos zero km, é importante ficar atento a esses detalhes já ao tirar a moto da concessionária.


Mas voltando ao mistério dos pneus da Bros:

Conferi as setas ao vivo em uma Bros que encontrei, e realmente o sentido de giro que parece errado está correto, o pneu dianteiro tem os sulcos inclinados para um lado e o traseiro para o outro, e as setas direcionais mandam montar os pneus exatamente desse jeito.

Qual a lógica disso?


É que os sulcos se destinam a facilitar a expulsão da água, lama e poeira e areia soltas.

Como esses pneus foram pensados para trabalhar em conjunto e oferecer o melhor desempenho nas piores condições urbanas (não trilheiras, que teriam cravos de borracha maiores), concluo que os engenheiros que desenvolveram o pneu descobriram que os sulcos invertidos apresentam uma vantagem.

Que vantagem seria essa?


Minimizar a chance de as bolachas de borracha (são pequenas demais para chamar de cravos) do pneu traseiro passarem por cima das pocinhas de lama acumulada expulsas pelos sulcos do pneu dianteiro.

Fazendo com que os sulcos se cruzem, uma quantidade menor de lama empoçada sobre o asfalto estaria presente para cada bolacha do pneu traseiro, diminuindo a chance de derrapagem.


Então uma explicação possível para as bandas invertidas seria a de que elas melhoram o desempenho do conjunto de pneus em situações específicas testadas pelo fabricante do pneu. 


A outra seria esta:


O que nos traz ao assunto da segunda pergunta, feita pelo leitor Anderson Carvalho na postagem Meu amigo está vendendo uma motona, será minha primeira moto:

Recentemente comprei uma Titan Mix e ela veio com pneu traseiro de tamanho correto, mas é desses que não tem a listra do meio, apenas alguns riscos [sulcos] do lado tipo esportivas e o dianteiro é original.


Queria saber esse pneu mais liso ele é mais seguro em asfalto ou o original com mais cortes [sulcos]?


Olá, Anderson! Obrigado por acompanhar o blog!

É como meu amigo Will comentou em resposta a essa pergunta, sulcos são fundamentais. 

A banda de rodagem é pensada na eficiência de eliminação de água, lama e areia, e esse trabalho dos pneus é pensado na atuação em conjunto.

O desenho da banda do pneu traseiro é pensado em função do que ele vai encontrar deixado pelo pneu dianteiro.


Imagem: http://quatrorodas.abril.com.br/moto/reportagens/pilotando-chuva-677712.shtml

Todo pneu precisa ter sulcos a partir do centro, exceto os pneus de competição, que só rodam em asfalto muito bom e não em dias de chuva (os pneus de competição para chuva são ranhurados).

Como são projetados para velocidades elevadas em condições ideais, os pneus de competição oferecem banda de rodagem lisa para melhorar o desempenho da moto.

Eles diminuem o atrito com o solo usando uma borracha um pouco mais dura no centro, e uma quase goma de chiclete nas laterais para melhor aderência em curvas, por isso acabam e são descartados após uma única corrida.


https://gulfcoastmotorcycles.wordpress.com/tag/riding-in-the-rain/
A função dos sulcos é eliminar a água debaixo do pneu, e se eles não existirem no centro da banda de rodagem, o pneu apresentará maior tendência a aquaplanar.

Não conheço um pneu novo que tenha a banda de rodagem lisa no centro com sulcos apenas nas laterais. 

Pesquisei qual pneu poderia ser esse semiesportivo descrito pelo Anderson, mas não encontrei nenhum pneu novo com essa característica — os sulcos de todos os pneus que encontrei sempre começam no centro do pneu.

Este é um pneu zero km do tipo sulcos laterais para Titan:

Então me veio na cabeça a questão...

Será que esse pneu do Anderson não está careca no centro da banda de rodagem?

Se um pneu como esse aí de cima for usado com pressão diferente da recomendada, ele irá se desgastar pronunciadamente na área central, enquanto os sulcos permanecerão vistosos nas laterais, dando a impressão de que o pneu ainda está novo.

Dá uma conferida nos indicadores de desgaste da banda de rodagem (marcas TWI), são esses ressaltinhos de borracha dentro de alguns sulcos.


Imagem: http://pardalnaestrada.blogspot.com.br/2012/02/dicas-para-viajar-de-moto-moto.html

Você os encontra mais facilmente procurando a gravação de letras TWI na lateral do pneu, elas indicam a linha onde os indicadores estão (ou estiveram).

Se os indicadores estiverem nivelados com a superfície, chegou a hora de trocar o pneu; se já tiverem sumido... vixi!

Além disso, vejo outro perigo no fato de você usar uma combinação de pneus com desenhos de banda diferentes.

Como vimos na resposta ao Darci, os pneus são pensados para trabalhar em conjunto. 

Usar pneus de tipos diferentes, apesar de serem da mesma medida que os originais, pode trazer alguma surpresa em uma condição menos comum que o uso do dia a dia.

Até existe a possibilidade de a combinação funcionar bem, mas não haverá nada pior do que descobrir que eles não fazem uma boa combinação em uma situação específica que não ocorre todo dia, como uma curva com pista molhada.

Fugindo um pouco do assunto, mas relacionado ao tema modificações em conjuntos de rodas e pneus:

Veja por exemplo o acidente que matou o Cristiano Araújo e namorada.

Ele colocou rodas de aro 22 polegadas em um carro projetado para usar rodas de aro 20 polegadas. 

Se ele usou pneus proporcionais ao aro, ele elevou a altura de um carro que já é alto. Deslocar o centro de gravidade para cima facilita a perda de controle em alta velocidade e capotagens.

Se ele usou pneus de perfil mais baixo a fim de manter o mesmo diâmetro externo do conjunto roda / pneu, a altura do carro e centro de gravidade não mudaram — mas a margem de segurança para enfrentar os buracos das estradas diminuiu ainda mais.

Nesses pneus de perfil baixo, as rodas passam a ter mais chance de quebrar por impacto porque há menos borracha e ar para absorver as pancadas — são rodas e pneus feitos para desfilar nas ruas da Califórnia, Londres ou Paris, e nunca nas estradas mal conservadas brasileiras.

Não tenho informação se a roda que supostamente estourou e causou o acidente foi uma das que tinham sido recuperadas com solda, outra prática que o pessoal faz porque desconhece os riscos associados à soldagem.

São riscos metalúrgicos, de preparação, de qualidade dos materiais utilizados, técnica de soldagem, habilidade do soldador... são tantas variáveis, que o mais prudente é não recondicionar elementos de segurança, sempre substituí-los por novos.

Finalmente, não posso deixar de falar sobre a não utilização do cinto de segurança no banco traseiro... não usar o cinto em um carro é a mesma coisa que não usar capacete em uma moto. 

Então, no caso dos seus pneus de modelos diferentes, eu sugiro sempre optar pela segurança de usar uma combinação original já testada pelas empresas fabricantes tanto dos pneus quanto da moto, a menos que sejam pneus de origem obscura que demonstrem mau desempenho, como no caso de algumas motos importadas.

Mas não seja preconceituoso: há pneus chineses, coreanos, tailandeses, etc. ruins e pneus chineses, coreanos, tailandeses, etc. bons, pelo menos no quesito aderência. 


Meus pneus Cheng Shin (saúde!) Hi-Max C907 nunca me deram nenhum susto, só não sei qual será sua durabilidade porque Edith e eu ainda não festejamos 8 mil quilômetros. Se tudo der certo, espero passar dos 10 mil no final de julho... hehehe 

Se os pneus forem ruins, aí sim valerá a pena trocar por um par de pneus nacionais de boa qualidade, desde que sejam da mesma medida que os originais, com o dianteiro e o traseiro da mesma marca e modelo.   

Um abraço,


Jeff

segunda-feira, 29 de junho de 2015

O cara mais sortudo do mundo

Nada como uma estrada vazia, uma moto e um dia lindo de sol.

Curvas e mais curvas, natureza (não muita), você filmando seu passeio para mostrar para os amigos, o que mais falta para ser um dia perfeito? (O vídeo tem 20 minutos, mas o acidente acontece logo aos 2:40 e depois a câmera fica só mostrando o céu e gravando os sons do socorro e o resgate de helicóptero)



Só falta um caminhão vermelho aparecer do nada na sua frente bem na hora que você entrou forte e abriu demais a curva.

Por essa ninguém esperava, muito menos o piloto — que não se preocupe, escapou milagrosamente dessa apenas com uma perna quebrada.

E o que ele fez no susto?

Ele tomou a pior decisão no meio de uma curva, ele tentou frear a moto. Não dá tempo.

Frear a moto na curva só fará você perder o controle e ir direto contra aquilo que você quer evitar.


A velocidade em que ele estava era alta para uma estrada cheia de curvas como essa (as 50 milhas por hora indicadas no painel são 80 km/h), mas não absurda a ponto de impedir que a moto se inclinasse ainda mais para fazer a curva.

Se ele tivesse contra-esterçado a moto, empurrando para frente o guidão do lado de dentro da curva, teria feito a moto esterçar rapidamente, a moto fecharia ainda mais a curva, e ele teria conseguido passar pelo caminhão.


E você não leu errado, eu disse empurrando para frente, colocando peso no guidão do lado de dentro da curva. 

É contra o instinto da gente, porque isso faria o guidão virar na direção do caminhão, mas é assim que a coisa funciona.


O contra-esterço ocorre devido aos ângulos da geometria da suspensão da moto e eu confesso, até hoje não consegui entender direito como funciona, mas o importante é que funciona.


Imagem baseada em: http://www.motorcycletraining.com/team-arizona-riding-tip-march-2013-countersteering/

É para situações como essa que você precisa conhecer a técnica do contra-esterço, mas não adianta apenas conhecê-la.

Empurrando para frente a manopla direita, o guidão vira para a esquerda enquanto a moto faz a curva para a direita.

Incrível, né? 

Mas é verdade, e isso já derrubou muita gente. Teste com muito cuidado, porque assusta.

Você precisa estar familiarizado com a técnica de maneira tão automática que seja capaz de praticá-la por reflexo condicionado.


Você sabe o que é reflexo condicionado?



http://pandawhale.com/post/47186/testing-the-reflexes-of-seven-kittens-gif
É aquilo que os lutadores de artes marciais praticam à exaustão, movimentos repetidos de maneira automática.

É por isso que eles conseguem reagir a uma situação e responder com a contramedida mais apropriada por instinto, sem precisar pensar no que fazer — os movimentos já estão decorados pelo corpo. 

O corpo age por reflexo, sem necessidade de o cérebro processar a informação — igual quando uma bola é jogada na sua direção e você a desvia com a mão. Vixi, péssimo dia pra escrever isso. Aquilo não foi reflexo, foi burrice ou má-fé. Aquilo outro foi má-fé ou burrice. Mas não posso falar mal da desculpa da virose, que a coisa anda tenebrosa por aqui.

O primeiro erro dele foi a descontração. Ele assumiu que não haveria mais ninguém na estrada e pilotou como se nunca alguém pudesse aparecer em sentido contrário.

Você não pode invadir a faixa contrária, nem mesmo em uma estrada deserta, porque você nunca sabe o que vem depois da curva.

O segundo erro foi travar o olhar naquilo que queria evitar, e não na maneira de se livrar do problema.

O terceiro erro foi tentar frear, mas disso já falamos.

erro essencial, aquele que veio antes de todos, o erro primordial foi não ter praticado o contra-esterço a ponto de reagir instantaneamente, empurrando o guidão do lado de dentro da curva para que a moto fechasse a curva ainda mais.

A reação instintiva de alguém quando vê a coisa ficar preta vermelha em uma curva é girar o guidão na mesma direção da curva — isso está errado, esse pode ser o seu (dele) último erro na vida.

Então você precisa aprender e treinar o contra-esterço para não reagir instintivamente para o lado errado, aquele que te joga para baixo do caminhão.

Transcrevo o comentário do Daniel, que quando ainda não tinha o juízo e a vivência que tem hoje, arrepiava nas curvas da BR-282 com a galera.

Ali ele poderia ter apenas baixado uma ou duas marchas para fazer freio motor, deitado mais a moto e apoiado o freio traseiro para trazer a dianteira da moto para a pista dele. 

Contra-esterço deve ser praticado com muita, mas muita cautela, pois ao fazer o contra-esterço a moto literalmente mergulha na curva, e dependendo da velocidade pode derrubar o piloto. 


Lembrando que para contornar uma curva já fazemos contra-esterço automaticamente, mas não percebemos. 


Contra-esterço fazemos ao iniciar a curva para fazer a moto mergulhar nela.

O contra-esterço joga a moto para baixo,"mergulhar" o corpo [fazer o pêndulo] é a melhor ferramenta, pois é contrapeso e altera o centro de gravidade [do conjunto moto e piloto].

Aí entram duas coisas: treino e conhecer a pista.

Eu não contornaria curva a 80 km/h pois é uma curva cega.


A pilotagem é um conjunto de fatores, conhecer os limites da moto, o teu limite, conhecer a pista, para aí ajustar a velocidade de entrada e saída de curva, onde frear, onde começar a mergulhar na curva, hora de abrir o gás, etc.

Postei aqui os comentários do Daniel, porque ele tem grande prática com pilotagem em alta velocidade, e essa vivência eu não tenho. 

Na minha opinião, técnicas avançadas de pilotagem como as que ele descreve estão fora da curva de habilidade de pilotos comuns, como eu e a maioria dos leitores do blog. O cara tem que ser bão, senão se estrepa.

Naquela situação do vídeo, eu também não entraria na curva a 80 km/h sem conhecer a pista, e tenho por norma nunca invadir a faixa contrária porque sempre considero que alguém poderá estar oculto atrás da curva, e ainda deixo uma margem de segurança porque ele pode estar fazendo a curva com metade do carro na minha faixa. Um pouco de gacaço te mantém longe do hospital. 

Somente sabendo usar as técnicas depois de praticá-las a ponto de estarem entranhadas no seu instinto e mantendo o foco na pilotagem, prevendo imprevistos, tendo a visão além do alcance, é que você se livrará de repetir os erros que já levaram tanta gente para o hospital.


O Jesse foi o cara mais sortudo do mundo porque escapou com vida e só quebrou uma perna ao bater contra o caminhão dos bombeiros no meio de uma estrada deserta. Hummm... talvez seja melhor mudar o título da postagem...

Outras postagens sobre contra-esterço:

http://minhaprimeiramoto.blogspot.com.br/2014/02/virei-para-um-lado-e-moto-foi-pro-outro.html

http://minhaprimeiramoto.blogspot.com.br/2015/01/minha-primeira-moto-sera-uma-alta.html

http://minhaprimeiramoto.blogspot.com.br/2015/05/nao-basta-acelerar-tem-que-saber-fazer.html

Um abraço,

Jeff e Daniel

sábado, 27 de junho de 2015

O que é fadiga do freio?

Fadiga é cansaço, mas como isso se aplica aos freios da moto?

Fadiga só acontece com freios velhos e desgastados?

Negativo. 

A expressão fadiga do freio pode levar a esse mal entendido, mas não tem nada a ver com a idade das pastilhas do freio — se bem que pastilhas velhas podem trincar e se desintegrar por uso repetitivo, e essa seria uma aplicação correta da expressão, a de fadiga por envelhecimento. 

A expressão fadiga do freio é usada para o fenômeno da perda de eficiência do freio devido ao uso excessivo do freio, provocando o aquecimento intenso das pastilhas, pinças e discos de freio.
Motos de competição atuais usam discos de fibra de carbono, que avermelham em temperaturas mais baixas do que os discos de aço, mas em compensação propagam menos calor para as pinças. Mas os discos de aço também conseguem ficar vermelhos, dependendo de quem estiver pilotando. Bons tempos aqueles, né, Daniel?
Imagem: http://pnwriders.com/threads/really-hot-rotors.178846/

Se esse aquecimento superar a temperatura do ponto de ebulição (fervura) do fluido de freio, ele formará bolhas dentro da pinça ou cilindro de freio.

Essa perda de eficiência ocorre diretamente pelo aquecimento das pastilhas e lonas, porque o metal aquecido se torna pastoso e diminui o coeficiente de atrito, mas também e principalmente pelo aquecimento excessivo do fluido de freio.

É como se o freio ficasse cansado de tanto uso, mas ele só está superaquecido.

O que distingue um gás ou vapor (bolha) de um líquido (fluido de freio) é que um fluido não se deixa comprimir. Pode pressionar à vontade que ele já atingiu o volume mínimo que poderia.


Já as bolhas de vapor ou gás sob pressão podem ser comprimidas, elas diminuem de tamanho quanto maior for a pressão aplicada no manete do freio.

Ora, quando você aciona o freio, você não quer comprimir bolhas, você quer que toda sua força seja transformada em pressão atuando sobre as pastilhas contra o disco de freio (ou lonas contra o tambor nos freios hidráulicos) a fim de parar a moto.


Por isso é importante sempre usar o fluido de freio com classificação DOT correta. Cada categoria atende a uma temperatura de trabalho.

Usar fluido de freio DOT 3 em uma moto que exija DOT 4 ou DOT 5, ou misturar esses tipos, causará uma reação química que apodrecerá as borrachas internas do freio, e também causará o aparecimento de bolhas muito mais cedo. É um descuido que pode ser fatal. Saiba mais nesta postagem do blog do Motociclista Curitibano.

Nas motos com freio a tambor de  acionamento mecânico por vareta, a diminuição do atrito pelo aquecimento das lonas e tambor também reduz a capacidade de frear.

Nos freios hidráulicos, quanto mais pressão sobre o freio, mais atrito ineficaz (porque parte da força é usada para comprimir as bolhas), mais calor é gerado e pior fica a frenagem.

Fadiga do freio também não é algo que ocorre somente em pistas de competição — ela acontece muito mais frequentemente em rodovias durante uma descida de serra. 

Pilotando em condições normais em trechos planos, ou mesmo em condições esportivas moderadas, o freio não chega a se aquecer a ponto de causar problemas.

Mas ao pilotar com agressividade a coisa muda de figura, e muita gente já descobriu a falta que o freio faz no momento em que você mais precisa, e poucos puderam contar.

Outra situação que causa fadiga do freio é descer uma serra mesmo em velocidade normal, mas usando apenas os freios para controlar a velocidade da moto — esse é um grande erro potencialmente muito perigoso.

Descer uma serra contando apenas com os freios, sem usar o freio motor, faz o calor gerado nos discos e pinças não ser removido pelo vento naquela velocidade relativamente baixa. A temperatura vai aumentando e pode chegar ao ponto de fervura do fluido bem naquela curva fechada na beira do abismo.

A fadiga dos freios acontece direto com caminhões descendo a serra. 



E pode acontecer com carros e motos também, se você não usar o freio motor para impedir que a moto ganhe velocidade na descida. 

A regra é usar a mesma marcha para descer que você usaria para subir a serra — isso reduz a necessidade de aplicação dos freios e evita o seu superaquecimento.

Este caminhoneiro ilustra o caso para os caminhões, e quase tudo que ele diz é aplicável também para motos:


Para poupar os freios, um trecho que você subiria a 30 km/h deve ser descido em segunda ou terceira marcha, no máximo; mais do que isso, você precisará usar muito dos freios e poderá entrar na zona de risco.

Mas tome cuidado com quem vem atrás de você.

O pessoal acha divertido descer a serra em alta velocidade e não imagina que os freios podem te deixar na mão, e é por isso que você vê tanta gente embicando em barrancos nos trechos de serra.

Um abraço, e boa viagem,

Jeff e Daniel
Dica: Para quem sai de São Paulo rumo ao sul, vale a pena evitar o pior trecho da serra do Cafezal desviando pelo litoral via Peruíbe ou então por Piedade até Juquiá (melhor passeio). Todo dia alguém perde o freio lá na serra e a estrada fica paralisada por horas até a retirada do caminhão, e de moto você não consegue avançar por causa dos obstáculos colocados sobre a faixa divisória de pistas.

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Seja visto, porque o tombo é dolorido — farol alto salva vidas

Uma variante do clássico acidente do carro cortando a frente da moto (que você viu na postagem Postes, árvores e outros obstáculos à visão — Por que os motoristas não veem as motos 4) é esta aqui:
Vídeo e reportagem: http://g1.globo.com/pr/norte-noroeste/noticia/2015/06/adolescente-e-arremessado-de-moto-apos-bater-em-carro-em-cianorte.html

Veja o vídeo na reportagem do g1 neste link.

Neste caso não há um poste largo o suficiente para encobrir a visão da moto que se aproxima, então por que o motorista cortou a trajetória da moto desse jeito?

Falta de atenção sempre será um dos motivos, mas os fatores que facilitaram a não visualização foram a coluna dianteira do carro causador do acidente e o farol apagado da moto.

No vídeo eu não consegui ver o farol da moto aceso.

Isso pode ocorrer por dois motivos:

1) Esquecimento do piloto

2) Lâmpada queimada

3) Uso de farol baixo ou apenas lanterna durante o dia

4) Errei a conta de novo.

As motos novas são equipadas com acendimento automático do farol, mas a opção de usar farol alto ou baixo sempre será do piloto.

E uma coisa que o pessoal não considera é que a lanterna ou o farol baixo são praticamente invisíveis durante o dia por causa da luz do sol.

Já o farol alto chama a atenção mesmo durante o sol do meio dia, faz com que você se destaque no meio da paisagem.

A menos que a(o) motorista esteja no celular, bêbado, no celular e bêbado, ou use cartão de condomínio ou enormes dados de pelúcia pendurados no retrovisor central, o farol alto aceso durante o dia aumenta bastante a chance de visualização da moto no meio da poluição visual do mar de carros e prédios atrás de você.


Compare a diferença na visualização pelo espelho entre motos com farol apagado e uma picape com o farol alto aceso durante o dia:

 Imagem: http://theblueflyer.com/Blue%20Flyer%20html%20folder/Police%20Vehicles%20Motorcycles.htm

Mesmo uma moto grande desaparece na paisagem — os faróis da picape lá atrás, muito mais longe, chamam sua atenção mais do que as motos bem mais próximas.

Agora veja a diferença da visualização de uma moto no meio dos carros com o farol alto aceso em plena luz do dia:

Imagem: http://www.bikebandit.com/community/articles/ride-like-youre-invisible-or-be-seen

Uma jaqueta colorida também ajuda bastante para que você seja visto pelos motoristas.

E se você ainda tiver alguma dúvida sobre a eficácia do farol alto contra o farol baixo, veja na imagem ao lado:

Você nem percebe que as motos da frente estão com o farol baixo aceso, mas vê claramente que a turma lá do fundão está com o farol alto ligadão.
Imagem: http://theblueflyer.com/Blue%20Flyer%20html
%20folder/Police%20Vehicles%20Motorcycles.htm

O ângulo em que a foto foi tirada reforça esse efeito, mas a diferença de visualização entre farol alto e baixo durante o dia é real e não muito diferente do que aparece na imagem.

Então é muito possível que aquele acidente do vídeo não tivesse acontecido se o motociclista estivesse rodando com o farol alto aceso durante o dia.

Rodar com o farol alto aceso a partir das 6 ou 7 da manhã até umas 5 ou 6 horas da tarde, dependendo da estação do ano (mais do que isso dá multa, é sacanagem e pode causar o seu próprio atropelamento por um motorista ofuscado) tem uma vantagem adicional:

O filamento do farol alto da lâmpada é mais resistente que o do farol baixo, e usando ele durante o dia todo e o farol baixo apenas à noite você prolongará a vida útil de sua lâmpada por muito mais tempo.

Mas não confie cegamente que o farol alto aceso garantirá sua visualização:

O cérebro humano só consegue se concentrar em um ponto da paisagem de cada vez e, quando você olha um cenário, vê a imagem continuamente, mas o seu cérebro interpreta apenas quadros isolados, saltando de um ponto para outro.
Os pontos que chamam a visão do motorista são os pedestres que podem atravessar de repente, os carros à frente e do lado, o semáforo e pontos que chamem a atenção, como relógios ou termômetros... Você e sua moto passam despercebidos na paisagem.
É em situações parecidas com esta, mas sem semáforo, que acontecem os acidentes de carros cortando a frente de motos.
 
Imagem inspirada na matéria: http://www.londoncyclist.co.uk/raf-pilot-teach-cyclists/ — O que um piloto da Força Aérea Britânica tem a ensinar aos ciclistas (e motociclistas). Muito interessante, use o tradutor do Google e leia, vale a pena.

Você não percebe isso, mas quando você varre uma paisagem com os olhos, o seu cérebro desliga momentaneamente o processamento de imagem, focando alguns pontos com maior atenção que outros. 

Se a moto ficar em uma dessas zonas mortas do processamento cerebral, desaparecerá completamente da visão do motorista porque o cérebro preenche os vazios com a visão periférica, não detalhada — e aí é o tradicional putz, cara, me desculpa, não te vi.

Olhar duas vezes eliminaria o problema, mas quase ninguém faz isso — dá uma olhada rápida e toca em frente, pensando que viu tudo que tinha para ver.

Por último, não se esqueça de verificar todos os dias como anda o funcionamento de todas as luzes de sua moto, fique de olho no reflexo do seu farol no carro à frente e, se tiver dúvida, dê uma conferida colocando a mão na frente do farol, porque uma lâmpada se queima sem aviso. 

Edith tem mania de queimar a lâmpada da lanterna traseira, já se vão três delas em apenas 8 meses. Não cheguei a trocar isso em quase 5 anos com a Jezebel. 

Como você nunca sabe quando sua moto vai aprontar uma queima de lâmpada contigo, esteja sempre alerta para não passar pela experiência de um voo de baixa altitude. 

Tirando a perda da moto, o voo até que seria legal, se não fosse o problema da aterrissagem.

Um abraço,

Jeff

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Um amigo está vendendo uma motona, será minha primeira moto

Comentário feito pelo leitor Ygor — obrigado por acompanhar o blog! — na postagem Um novato e uma moto potente, aquela do shit shit shit.

Se você ainda não viu o vídeo, veja de novo porque é muito instrutivo para os novatos — e por novato eu quero dizer novato em pilotar uma moto, não necessariamente alguém recém habilitado. Os comentários entre [] são meus.



Jeff, coloca mais ênfase na palavra novato, porque muito além da inexperiência de 90% das pessoas que compram uma moto de alto rendimento como primeira moto, ela compra na bacia das almas e às vezes mal sobra dinheiro para a gasolina.

Enfim, o que quero dizer é que esse pessoal coloca a moto com valor maior que a própria vida, é dessa inversão de valores que estou falando.


Um motociclista que subiu os degraus sabe o devido valor de cada coisa.


Nesse caso [do acidente do vídeo] seria preferível bater na traseira do caminhão do que cair entre eles perigando ficar embaixo de suas rodas.


Em última instância já no corredor da morte ele teria de travar os braços e abrir mão dos seu caríssimos retrovisores, além do que, posso estar enganado, mas cabia quase outra carreta ali no meio kkkk [hehehehe].


O maior problema dos novatos é social, no Brasil devia ter sim escala de categoria na categoria A, na B nem tanto. 


Me desculpe, sou motociclista e andar de carro é totalmente diferente de andar de moto, e devíamos ter um seguro obrigatório como na Austrália.


O bonito de 18, 19 anos quer andar de Hayabusa, que bom, pode sim, pague o valor dela em seguro obrigatório a terceiros, e o valor do seguro iria diminuindo na medida em que a experiência aumentasse, assim a última categoria de carta não precisaria desse seguro.


O que o Ygor falou é muito importante:

Você pode ter 20 anos de habilitação em carros, mas uma moto é realmente algo totalmente diferente, motos são traiçoeiras e cheias de manhas e mumunhas. 

Jessica Rabbit à cata de um coelho

É por isso que eu as amo — são traiçoeiras quando você pisa na bola, mas não por vontade própria. 

Elas não são más. Apenas são levadas a esse caminho. O trocadilho no inglês é ótimo.

Concordo que deveria haver uma escala gradativa para a habilitação, ninguém deveria poder começar direto com uma moto muito potente sem antes passar por um período significativo com motos menores.

A capacitação deveria ser no mínimo anual e em 3 ou 4 níveis de cilindrada / potência — superesportiva só perto dos 25 anos, que é a idade do juízo para muitos. Não todos. 

Isso salvaria muitas vidas, mas iria contra os interesses econômicos de muita gente, afinal as motos pequenas mantêm a concessionária / empresa funcionando, mas o lucro mais gordo vem da venda das motos grandes.

Alguns macetes de manutenção inexistentes nos carros — como a regulagem periódica da corrente ou a medição do nível de óleo do motor/câmbio com procedimento diferente daquele que você conheceu a vida inteira — podem causar acidentes e danos graves, só que ninguém fala isso na hora de te vender a moto. 

Mas não é só o bonito (para a mãe dele) de 18 ou 19 anos que cai nessa armadilha de comprar de cara uma moto muito potente. 

O pessoal da minha geração (nasci em 1961, tinha 8 anos quando Armstrong e Aldrin pousaram na Lua e o coitado do Collins ficou lá dando voltas e foi esquecido pela História)...ops, devaneando de novo...

Como dizia, é comum o pessoal da minha geração chegar na idade da realização plena, filhos criados, síndrome do berço vazio, vida caindo em uma rotina sem graça...

Chega uma hora, ele se cansa da monotonia e fala: 


Quer saber? Vou fazer o que sempre tive vontade, mas nunca fiz porque o trabalho, o casamento, o compromisso de criar os filhos nunca deixou.


Aí o tiozão sujeito em questão resolve se dar de presente uma moto.


Depois do divórcio (ou não), se sobrar alguma coisa, o cara opta por comprar a moto mais vistosa que o seu saldo bancário puder se comprometer a financiar em 50 meses com taxa 0% (porque os juros exorbitando a Lua já estão embutidos no preço). O coitado não imagina o que ele vai gastar com a manutenção da moto, aí quem ainda não está divorciado acaba se divorciando de vez.

Esse é um dos maiores erros que o novato pode cometer, o de já começar de cara com uma moto grande e potente, falo isso desde a primeira postagem.

O velhote homem maduro de meia idade parte de cara para comprar uma moto de cilindrada 600, 900, 1200, 1800... se aparecer maior vai acabar comprando também.


E aí descobre algumas verdades doloridas da vida. Ou acaba com ela de vez, como quase fez o rapaz do shit shit shit.


No vídeo ele afirma que não conseguiu frear. E por ser novato, não usou o freio motor, que nas motos pode ser muito mais intenso do que nos carros — se você souber reduzir as marchas.


O sujeito se apavorou e não conseguiu dominar a moto para passar em um espaço estreito em que qualquer um passaria, acabou dançando e só não morreu por pura sorte. E porque o Vadão não tava lá.

Imagem: http://www.buzzpirates.com/2009/07/the-ballad-of-porkins-the-fat-guy-pilots-death-in-star-wars/

Essa inexperiência também se deve ao fato de que em outros países o uso do corredor é punido rigorosamente, mesmo com o trânsito parado, então ele nunca tinha feito aquilo na vida.

O cara tiozão tira a moto da concessionária e pensa que sabe tudo de trânsito porque dirige carro há 30 anos.


Mas andar de carro é fácil, basta acelerar, não bater no carro da frente, não atropelar ninguém e saber fazer baliza. 


O carro tem quatro rodas, ele não cai.


De moto você tem que aprender a ler cada particularidade do trânsito.


Você precisa analisar os riscos potenciais a todo instante, não basta prestar atenção só no carro na sua frente.


É necessário perceber que o trânsito está parando 200 metros lá na frente para que você possa parar sem cair aqui atrás. 


Você precisa começar a frear junto com aquele cara do 4º ou 5º carro lá na frente, muito antes de o motorista do carro que você não quer bater meter o pé no freio.

Você precisa ficar o tempo todo de radar ligado detectando possíveis ameaças e planejando maneiras de escapar dos imprevistos, porque alguém vai entrar na sua frente, é certeza.


Se você se basear apenas na sua experiência com carros, ficará travado sem saber o que fazer na hora do perigo, e travar no comando de uma moto pode ser fatal.


Foi o que aconteceu com esta menina que não teve reação imediata ao ver um carro se aproximando na contramão:


Vídeo e reportagem: http://g1.globo.com/mato-grosso/noticia/2015/06/imagens-mostram-atropelamento-de-mulher-em-avenida-de-cuiaba.html

Infelizmente ela não sobreviveu, mas se tivesse desviado para o posto assim que viu o carro na contramão, hoje ela poderia estar contando a história para os amigos... é muito triste.

Esse tipo de traquejo você não aprende na auto ou motoescola.


Você só tem chance de aprender com uma moto pequena.


O novato acostumado a sentar no banco do motorista pensa que é a mesma coisa com uma moto, só sentar e acelerar. 


A pilotagem envolve prontidão do piloto e capacidade de usar o corpo todo rapidamente para realizar manobras de emergência. Sua vida pode depender disso um dia, então você precisa estar sempre ligado em tudo que se passa.


Comece com uma moto pequena (o prejuízo inevitável dos espelhos, piscas e manetes quebrados da primeira moto será bem menor) e adquira esse traquejo que é cada vez mais exigente de força física e prontidão quanto maior for a capacidade de aceleração de sua moto.

Quanto ao seguro obrigatório, o que penso é que toda vida é valiosa, independente de o cara poder comprar uma Vayabusa aos 18 anos, e um seguro para terceiros só resolveria o problema do conserto do veículo dos terceiros... não traria vidas de volta.

Então prefiro continuar minha campanha de conscientização para que até mesmo o carinha filho daquele cara envolvido no escândalo político financeiro do dia da hora do último minuto não se mate e não mate algum inocente no trânsito. Já o pai dele, quero mais é que se утконос.

Ah, mais uma coisa:

Não se iluda de começar com uma moto custom pensando que motos custom são motos pacatas que você compra para desfilar no fim de semana e não para andar em alta velocidade.

Uma custom potente (não uma Kansas) consegue acelerar mais rápido do que uma esportiva em uma arrancada do zero (é sério) porque  tem muito mais torque, e em compensação também é muito mais difícil de parar e equilibrar devido ao peso maior. 



Só isso já é suficiente para o novato se atrapalhar todo. 

E você sabe quanto custa um tombo com uma esportiva ou uma custom?


Mais do que você perdeu ou certamente perderá no divórcio. 


Um abraço,


Jeff


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